sexta-feira, 7 de maio de 2010

Experimente

Hoje percebi que as coisas mudam de sabor com o passar do tempo. Aquele chocolate que você comeu ontem, pode não ter o mesmo sabor amanha. E não é a industrialização.


Pense nisso.


Tudo muda de sabor. Aquela música que você sempre odiou e torcia o nariz como se tivesse um limão na boca, pode muito bem ter um gosto de abacaxi com muito açúcar. Percebe que não se perde a acidez?


Ir para a praia no começo pode ter um gosto óbvio, salgado, mas com o tempo passa a ter um gosto de peixe. Pode ser salmão, atum ou bacalhau. Enxaguado com muita água de coco.

Uma vez ouvi que o Outono tem gosto de madeira, ou beterraba, não lembro. Pra mim não tem gosto de nada. Ainda. E pra você? Tem?


Levando a um outro patamar. As minhas vitórias e derrotas. Também possuem sabor. Um sabor que muda periodicamente. Um sabor, que hoje chega a ser puro e entorpecente, independente de serem opostos. Por vezes, claro, contrasta com sabores estranhos, meio agridoces, salgado ou simplesmente doces demais.


São tantas as coisas não óbvias que possuem gosto. O amor, por exemplo, dizem que é doce. Eu não sei, nunca provei, mas entendo o porquê disso.

A saudade sempre teve um gosto bom, só nunca consegui definir. Ela é inconstante e me abala fácil, dificulta o degustar.


O dormir é quase como um copo de água com açúcar. Já o levantar depende. Apesar do gosto amargo da boca, é possível piorá-lo, quando se lembra daqueles compromissos azedos logo que se abrem os olhos.

Mas bom mesmo são os programas com entrada, prato principal e sobremesa. Preparado por grandes chefes.


Um carinho, no caso, um beijo. Também não é diferente. Aquele beijo que antes parecia apimentado e selvagem, hoje, (in)felizmente, se tornou algo doce e quente, mas não a um nível selvagem. Uma pergunta, uma conversa, uma intimidade, uma desavença, segundos, mudam tudo. Muda o gosto. Muda a forma como ele se processa na cabeça. Não é a mesma coisa e nunca mais vai ser igual. Isso é bom? É ruim? Só você para ter ciência dos benefícios e malefícios dessa evolução/mutação.


Não volta, não tem jeito.


Você pode sentir muita falta do sabor daquele guarda-chuvinha de chocolate que não tem mais por ai. Da comida da sua mãe. Daquele salgado que você comeu num café em Buenos Aires. Mas a lembrança vem como uma brisa e brisa é foda. Vem devagar, suave, porém é TÃO boa que acaba te deixando com expectativas e saudade.

Chega a decepcionar quando você, por ironia do destino, encontra o chocolate num mercadinho qualquer, quando você visita a sua mãe ou quando você sai de férias em Buenos Aires. Decepciona porque já não é igual. A lembrança muda, você muda, o mundo muda. Sua vida muda... De sabor.


Uma mesma mistura de alimentos ingeridos por um tempo. Alguns são bem comuns, outros mais escondidos no fundo do armário e aqueles que você nem imaginava que estavam ali. As pequenas surpresas.

Passa-se um tempo e se tira uma foto mental do armário. Já é outro, tudo mudou. Mudam-se os rótulos, mudam-se as posições e em alguns casos, a substituições, por alimentos de baixa caloria, por exemplo. Nisso, aquele arroz novo, quando misturado com o feijão antigo, vai criar uma nova experiência que não só da vida a um novo sabor, como modifica o gosto do feijão pra sempre. Deixa o sabor antigo, apenas na memória.


E este é meu dilema. A água que bebo agora, tem gosto. Um gosto estranho, diferente. Quase não sinto vontade de beber, mas tenho muita sede de água. Seria a minha cabeça criando um sabor? Seria o meu dia difícil? Ou o copo esta, apenas, mal lavado. Não importa. O gosto esta aqui, não me agrada. E isso basta pra me fazer pensar.


E hoje, a essa hora, justamente nessa hora, eu não queria sentir esse sabor. Não queria.


Ao Som de: Anathema - A Natural Disaster

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